Texto: Rui Pedro Tendinha, em Cannes
Fotografia: Rico Torres
Uma cena de decapitação, outra de radical canibalismo e também a famosa sequência de castração.
Isto fez de Hostel2, acabado de estrear, alvo de controvérsia.
Já o consideraram "Tortura pornográfica" e ao seu realizador, Eli Roth, um tarado perigoso.
Falámos com este protegido de tarantino e convidámos um psicoterapeuta português a avaliar o potencial grau nefasto desta sequela.
Afinal, quem tem medo do papão da violência em Hollywood?
É uma vaga, uma moda em hollywood: filmes de terror com violência explícita e sempre com a temática da tortura como prioridade. São os chamados gornos (junção da palavra gore com porno) ou torture porn. A discussão já tinha estalado quando os estúdios americanos começaram a apostar neste tipo de filmes, sobretudo em 2005, o ano dos sucessos de Saw – Enigma Mortal e do primeiro Hostel. O rastilho da contestação aumentou na véspera da estreia de hostel 2 nos EUA, no passado mês de junho. Os detractores bateram forte e feio na forma como a violência começou a ser completamente explícita.
A grande maioria da imprensa americana atacou o fenómeno do "vale-tudo" em violência e chamou, literalmente, "irresponsáveis" aos realizadores e produtores. O certo é que esses filmes fizeram muito, muito dinheiro nas bilheteiras. Uma nova geração de espectadores já não engole nenhuma obra de terror sem as entranhas bem à mostra ou os miolos de uma miúda bem escarrapachados em primeiro plano. Com tantos protestos, começou a pensar-se que, se houver recuo de violência nesses filmes, estaremos então perante uma certa forma de censura. Levanta-se, obviamente, a questão da liberdade de expressão artística.
Em defesa desta tendência poderão estar argumentos que apontam para o direito à transgressão. O segredo do sucesso é precisamente dar a impressão ao espectador de que está a ver qualquer coisa de perigoso, de proibido. Em todos esses filmes a tónica, para além da tortura, é sem dúvida o grau elevado do sadismo dos vilões, todos eles de uma imoralidade inimaginável.
Quem parece estar a ser o principal bode expiatório disto tudo é Eli Roth, realizador vindo do cinema independente e especialista em emoções fortes. Foi ele quem criou e imaginou a demência confessa da saga Hostel. É ele quem está a ser acusado de "mente doentia" ou cineasta com tendências sádicas. Para desmontar as acusações, chegou a consentir que um grupo de psicólogos e psiquiatras o avaliasse a partir do visionamento de Hostel 2.
Por muito que todos os fotogramas salpiquem sangue, os psiquiatras desmentiram qualquer distúrbio mental. A reputação de Roth acabou por não ir totalmente ao ar, mesmo depois de muitos, inclusive colegas, terem concordado que tinha ido longe demais. Quem sempre o defendeu foi Quentin Tarantino, que já o tinha ajudado no primeiro Hostel. Ambos os filmes chegam com um rótulo "Quentin Tarantino apresenta" e foi o próprio realizador de Pulp Fiction quem o escolheu para actor em À Prova de Morte, eventualmente também um filme de terror com pernas amputadas e algum banho de sangue.
Como não poderia deixar de ser, a violência no cinema, à luz dos nossos dias, tem os seus adeptos. Em 2007 já não nos assustamos com sangue à distância e são muitos os defensores deste imaginário cru. Filmes como SinCity ou o próximo Rambo usam e abusam dessa opção explícita, não sendo catalogáveis como películas de terror. Ou seja, o horror ganhou na América uma bravura mais realista e quando em Setembro chegar Planeta de Terror, de Robert Rodríguez, ficaremos a pensar se toda esta gente não anda a competir para ganhar o prémio do mais repulsivo, nojento e impressionante filme da história do cinema.