INSIGHT na imprensa

É mentira, e depois?

Há quem o faça por diversão, por compulsão ou por profissão.
Mentiras medonhas, mentiras piedosas, mentiras tão repetidas que se tornam verdades. O polígrafo regressou à TV: no programa da SIC Momento da Verdade, os concorrentes ganham dinheiro por cada confissão.

A VISÃO também "poligrafou" alguns dos embustes célebres.

Da História das nações e das nossas pequenas histórias privadas por ANA MARGARIDA DE CARVALHO* TEXTO HÉLDER OLIVEIRA/WHO ILUSTRAÇÃO


MINTO QUANDO DIGO MINTO

Sessenta por cento dos indivíduos, contabilizou um estudo na Universidade de Massachusetts, mentem uma vez, durante uma conversa. Uma sondagem publicada no jornal Washington Post, feita a mais de 2 mil trabalhadores americanos, revelou que um em cada cinco aldrabava pelo menos uma vez por semana "para acalmar um cliente, para disfarçar um erro, ou simplesmente para justificar um atraso". Seja por reacção defensiva ou por complexo de vaidade... Seja por recalcamento, para proteger a honra ou por puro acto gratuito... Os criminosos levam longe a mentira, e a consequência logo se vê: "a estratégia habitual deles é a mentira, porque foi assim que fizeram com eles. É uma questão de aprendizagem. Não têm um pensamento alternativo e, portanto, mentem até nas maiores banalidades."

 

A grande dificuldade do tratamento da mentira, explica Rui Coelho, psiquiatra e professor da Faculdade de Medicina, da Universidade do Porto, é justamente "perceber as razões que levam as pessoas a mentir". O professor distingue vários vários graus.

Aquele grau inofensivo da mentira social, que leva a elogiar-se um penteado duvidoso. Os mitómanos também são por ele considerados inofensivos, efabulam muito, exageram, ninguém os leva a sério. "Mas há graus que denotam grande perturbação da personalidade. A mentira torna-se potencialmente perigosa, é usada como forma maligna de ataque ao outro", acrescenta.

 

"Entre os dois extremos, há a mentira de autopreservação, mente-se para se ser aceite pelo outro, para se conquistar o seu afecto."
Mentimos, em primeira instância, àqueles que nos estão próximos. A mentira conjugal é a mais popular, e tem abastecido a ficção, da literatura às telenovelas e aos mexericos das vizinhas. "O tipo de mentira mais comum nos casais prende-se com as relações sexuais. "As mulheres ocultam a falta de prazer. Os homens a procura de outras parceiras e do erotismo na net", revela Vasco Soares, psicoterapeuta familiar.


E chega o dia em que todas as crianças descobrem o milagroso estratagema do "não fui eu". "É comum os pais mentirem aos filhos. E estes vão aprendendo com eles", continua. Às vezes, a mentira paterna é inconveniente: "Mesmo os assuntos mais sérios podem ser traduzidos de forma acessível às crianças. Por outro lado, uma verdade dura contada a seco, sem cuidado ou preparação, pode ser traumático", observa o terapeuta. Vêm as cegonhas de França, os velhos do saco, as fadinhas dos dentes...

 

Os pais mistificam e omitem coisas às crianças: "E estas, quando forem adultas, também não saberão falar de certos assuntos com os filhos."

Fica instalado o circulo vicioso.